Diálogos


O DIREITO

 

- E sobre o Direito? Quais as idéias que mais o ocuparam durante seu magistério e que o senhor gostaria de deixar aqui ao menos referidas?

- Na Faculdade de Direito, minha primeira preocupação foi com a forma de ministrar a cadeira de Propedêutica Jurídica, à qual dei fundamentação em base psicológica e pedagógica. Utilizei para isso as lições da Gestaltpsychologie alemã, relativas à teoria da percepção.

Quando assumi a cadeira, percebi que os professores, em geral, a transformavam numa Sociologia Jurídica, sem utilidade nenhuma, ou numa espécie de Enciclopédia Jurídica. Estive naquela época em São Paulo e encontrei, entre outros, nosso amigo Spencer Hampré, para quem a natureza da cadeira propedêutica era de História do Direito. Outro colega transformou-a em Teoria Geral do Direito, na qual estudava as categorias jurídicas. Eu tive que tomar uma posição, pela tarefa que haviam me confiado; por isso, fui bus­car na Gestaltpsychologie os fundamentos psicológicos para atender à Propedêutica Jurídica.

                        Utilizei, como disse, a teoria da percepção. No processo perceptivo, segundo a Gestalt, o contato inicial com o objeto é uma visão global, dogmática, sem nenhum discurso analítico. O objeto é um dado que se impõe, é um dogma, uma formulação dogmática na qual o indivíduo tem a visão do conjunto, mas não a percepção dos aspectos que o integram. Isso, evidentemente, não é algo cronometrado, mas é a natureza do processo perceptivo. Num segundo momento, apreendem-se alguns aspectos, fixam-se alguns elementos que com­põem esse todo. De logo, após a análise, segundo a Psicologia da Forma, a Gestaltpsychologie, por uma exigência fundamental do pensamento, procede-se à reconstituição dos elementos nela encontrados depois da primeira percepção. A primeira fase da percepção é, por­tanto, sintética, dogmática, global. A segunda, analítica. A terceira é de uma recomposição da síntese na base da análise prévia. Então eu embasei a cadeira de Introdução à Ciência do Direito nesse enquadramento psicológico e pedagógico. Como primeiro momento da percepção do Direito, ela deveria ser uma cadeira de síntese dogmática; a ela se seguiriam quatro anos de análise jurídica; no quinto ano da Faculdade, se chegaria à segunda síntese, agora crítica, que é a cadeira da Filosofia do Direito.