| Discursos MENSAGEM DE PARANINFO1 Meus diletos paraninfados da
Faculdade de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica: Quis a providência que uma súbita
enfermidade me privasse da alegria de assistir à vossa colação de grau. Assim, talvez, tenha sucedido
para que, nessa oportunidade, o paraninfo permutasse a atitude oratória pelo
gesto orante. Não farei o discurso de praxe, do paraninfado; mas realizarei,
cordialmente, o que deveria ser de estilo em atos de formatura - rezarei por vós.
Formandos em Filosofia e de uma universidade pontifícia, é evidente para vós
que, assim fazendo, renuncio a um gesto geralmente estéril, por uma atitude,
sempre fecunda. Discursando, é possível que
impressionemos inteligências que nos ouvem; rezando, é certo que a graça nos
faz modificar vidas que amamos. Aliás, não é a oratória,
nem a ciência, nem a técnica, nem mesmo a Filosofia que sustentam, ainda, este
nosso ameaçado mundo humano, suspenso sobre a barbárie e o absurdo; são as mãos
orantes, são os gestos de tade que os distintos leitores tiveram até o
presente como todos os seres mortais, de todas as almas batizadas que se imolam,
rezam e agem, pelo advento do Reino de Deus entre os homens. Com esta observação, eu vos
comunico, talvez, a única idéia vital e fecunda do discurso que vos deveria
apresentar. Ei-la: Enquanto o pensamento não fixa, através de uma doutrina
ontológica, uma axiologia integral, é vã e estéril, para os fins de
constituição de uma autêntica existência humana, a mais lúcida visão
fenomenológica, a mais rica descritiva do mistério do ser, a mais eficaz técnica
de manipulação dos fenômenos naturais e sociais. A tentativa de superação da
verdadeira ignorância humana, daquela que impede a organização de nossa vida
racional e moral, não consiste em buscarmos saber como o mundo existe e como nós,
nele, existimos. Só quando as vitais interrogações do espírito sobre o
valor, sobre o sentido e sobre a destinação do ser são verdadeiramente
respondidas, a cultura humana deixa de ser um luxo de mendigos, uma euforia de
caquéticos, um banquete de pratos vazios. E essas respostas salvadoras
da vida, possibilitantes da cultura e da universal inteligibilidade, essas
respostas que condicionam as afirmações triunfais e básicas da existência
espiritual e ética do homem, foram mais revelações do Amor Incriado, do Verbo
que se fez homem e habitou entre nós, que descobertas da pura razão. Foi porque o Absoluto
investigado pelos filósofos e adorado pelos profetas, foi porque o Deus da razão
e o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó invadiu a História, penetrou no tempo
e sua vida sobrenatural derramou-se sobre o mundo; foi porque, assim, surgiu a
Igreja e, com ela, o conhecimento do Único Necessário e a força de realizá-lo,
foi por tudo isto que a pessoa humana, na posse da Verdade que a liberta e da
Vida que a eterniza, superou a ignorância essencial e fatal, e ficou apta para
consumar seu destino: a realização do Reino de Deus - em si, pela caridade e
pela santificação, e, no mundo, através da cultura iluminada pelo Evangelho e
pela Igreja. Assim sendo - e vós tendes a
evidência de que assim é - creio que mais faço pela vossa felicidade de novéis
filósofos rezando por vós, que vos prelecionando sobre a Verdade que liberta e
que salva! "Qual a outra causa do filosofar", já perguntava Varrão, nisi
sit beatus? Orando, Deus me possibilitará fazer-vos felizes; discursando, no máximo, vos revelaria a possibilidade e o dever de serdes felizes. Meus diletos afilhados: Esta a mensagem, talvez enferma, que vos dirige vosso paraninfo enfermo, e que oferece por vós a renúncia da alegria de ser espectador de vossa exultação espiritual, ao festejardes, no ato de formatura, a vitória da inteligência humana transfigurada pelo Verbo, na posse do conhecimento essencial, sobre as trevas da ignorância do "único necessário". Rejubilo-me, cordialmente,
convosco, nesse ato em que, parafraseando São Paulo, como o Apóstolo na
posse da certeza cristã da imortalidade, podereis perguntar, triunfalmente:
Ignorância, onde está tua vitória?! 1
Não podendo comparecer quando escolhido para ser paraninfo dos
bacharelandos da Faculdade de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica,
o Prof. Armando Câmara enviou sua mensagem aos paraninfados. |