| Temas políticos A REALIDADE BRASILEIRA O Brasil é, hoje, um mosaico
de desagregações anárquicas e tensões pré-revolucionárias. As técnicas
subversivas marxistas e caudilhescas induziram-nos a uma situação político-social
que oscila entre o mórbido e o trágico, fazendo do país uma gigantesca feira
de contradições. Entre a anarquia e a revolução,
a realidade nacional é um pandemônio, mais resultante de crimes que de
loucuras, de traições que de obsessão, de mistificações políticas que de
alucinação coletiva. Com uma confusão planificada
e dirigida, imprime-se ritmo vertiginoso à realização das reformas,
gaguejadas através dos microfones comprados com o dinheiro da traição ao
regime. Procura-se hipnotizar, aturdir a Nação, inibir suas reações críticas
e a liberdade de suas opções. Não se permite ao povo nem mesmo a
possibilidade de sofrer o seu drama, pois este não existe onde se oblitera a
consciência e se coage a liberdade. Estamos na iminência de tratar a mais
aguda crise histórica e institucional do país, cuja superação exige a
convergência de todas as reservas de prudência e sabedoria política, através
de um comportamento automático, de um ato reflexo de defesa instintiva. Nesse jogo alucinante de
conciliação dos contraditórios, os mesmos artífices da desordem social que
sofremos, fugindo à responsabilidade dos cargos que ocupam, apresentam-se como
juízes dos males que criaram e salvadores das massas cuja espoliação não
souberam e não quiseram evitar. Pregam, no plano internacional, a autodeterminação
dos povos e, no quadro da política interna, conspiram contra as livres
manifestações da consciência democrática do país. Em nome dos imperativos
da legalidade, farisaicamente evocada, promovem agitações sociais que
determinam a comoção de toda a ordem jurídica vigente. Nesse bazar de incoerências,
em que se utilizam as liberdades democráticas para destruir a democracia, em
que um mesmo governo governa, simultaneamente, com diretivas políticas antitéticas,
tentando conciliar as contraditórias polarizações capitalistas e socialistas,
em que os réus se transformam em juízes e os escravocratas em libertadores líderes
cristãos, colaborando com marxistas, conclamam, em nome do evangelho, à luta
fratricida no preciso momento em que intencionam ser apóstolos da fraternidade
e da paz! Buscando humanizar uma economia escravizada, marcha-se para a
escravização das demais áreas sociais. Para libertar a servidão das favelas
estamos na iminência de instituir a servidão política. Para socorrer a miséria
econômica, somos conduzidos à sua generalização e à organização do
pauperismo nacional. Nesse estilo anárquico de
reformas, o pão que se busca custará, amanhã, o preço da liberdade que se
tem. Essa indisciplina social
torna-se mais inquietante, pelo fato de os poderes públicos não só se
omitirem face a ela, mas ainda, subrepticiamente, com ela se acumpliciarem.
Esboroam-se os fundamentos da autoridade no país. A autoridade está
periclitante nas casernas, nas escolas, na área obreira e nos quadros da
administração pública. Daí, as quarteladas e as greves políticas que
paralisam a economia e desorganizam as finanças nacionais. Daí, as pressões
alucinantes que realizam sobre o governo os falsos líderes das forças
sindicais, metamorfoseados em catedráticos da ciência política e conselheiros
da República. Essa situação atinge o clímax,
torna-se apocalíptica, quando as autoridades incumbidas da preservação da
ordem constitucional e do regime democrático lesam esta ordem e conspiram
contra este regime, permitindo a hedionda exploração dessas tensões sociais
pelos agentes da subversão mundial. E, assim, uma crise econômica, pela sua
explosiva saturação ideológica, degenerou em drama histórico. A periculosidade da presente
conjuntura social não radica, pois, tão só em nossa caótica situação econômica,
mas, precipuamente, se alicerça na criminosa utilização que dela fazem a
cupidez de chefes políticos remanescentes de uma obsoleta mentalidade feudal, e
o instinto predatório do comunismo. Se as reformas sociais que
empreendemos se processarem, nas circunstâncias e através dos métodos e dos
equacionamentos em que se estão realizando, do Brasil autêntico só restará
uma geografia, nunca uma Pátria. Não mais podemos silenciar
diante da irresponsabilidade dos charlatões do bem comum, dos doutores do
oportunismo e do instrumentalismo político, que, profanando o drama proletário,
impedem a sua superação. Não é mais possível permitir que, pretextando
humanizar a economia nacional, desumanize-se a Nação, desfigure-se a sua história
e conspire-se contra a sua soberania. Urge fixarmos as condições
sociais e políticas, os pressupostos ideológicos e éticos, os métodos justos
das reformas necessárias. A primeira condição de reordenamento do país é a
modificação das circunstâncias em que se realizam suas reformas sociais. Elas
devem ser obra da razão e da liberdade, atendendo ao apelo dos valores e dos
fins humanos. Elas se devem processar sem coações, sem medo e sem embustes,
com lucidez e serenidade, em clima democrático, e nunca sob pressões demagógicas
ou sob imposições ditatoriais. Reformar não é apenas
destruir, mas criar a forma nova de uma realidade que se quer conservar. A
demagogia reformista, no entanto, parece mais ocupada na destruição da ordem
vigente, que preocupada com o esforço criador da nova ordem. E é óbvio que a
primeira condição para que se realizem as reformas de base é a
intangibilidade da existência da própria Nação que se quer reformar. A segunda condição de
praticabilidade das reformas autênticas é a postulação de um humanismo político,
que, iluminando a problemática social, inspire as justas soluções que lhe
devem ser propostas. Todo ato humano, que se quer fecundo e criador de
valores, está sempre fundado em idéias, em representações que lhe indicam os
fins e lhe revelam os itinerários. A ação política, particularmente quando
retificadora de estruturas sociais, está saturada de doutrina, é densa de
ideologia que busca realização. Assim, na dinâmica revolucionária do
Marxismo, o partido é, tão só, o instrumento de aplicação de uma teoria. Esse humanismo, postulado como
exigência vital para a superação do drama social que vivemos, será a réplica
adequada à natureza da crise que convulsiona o país. Crise de natureza ideológica,
que se desdobra num quadro de confusão pré-revolucionária, ela exige a
resposta de uma doutrina de ordenamento social, que se imponha pela objetividade
de suas teses, pela evidência de suas verdades e que, ordenando o pensamento,
discipline a comunidade. Carecemos da postulação de
um humanismo político, que nada tendo de xenófobo, não se dilua, no entanto,
nas linhas de um cosmopolitismo revolucionário, ou de um apatridismo desumano,
e que, embasado nos valores ecumênicos que dinamizaram os surtos da civilização
ao longo da História, seja harmônico com o espírito da realidade brasileira. Busquemos, pois, a definição
desse humanismo que condiciona o êxito das reformas nacionais. A consciência da diversidade
entre o que somos e o que podíamos ser, entre o real e o possível, em nossa
existência, é fonte de perfeição humana. Mas essa visão das possíveis
projeções de nossa vida pessoal ou social, para que não seja miragem que leva
à esterilidade do deserto ou ao limiar do caos, deve ser aferida pela norma
fundamental e fundamentante de toda ação humana - pela sua conformidade com a
natureza e com os fins do homem. Mas que é o homem? Que é sua natureza? Somos
pensamento e, por isso, somos liberdade, embora chumbados à servidão de uma
existência carnal. Essa condição existencial de que temos a evidência
experimental e a concreta certeza, revela que somos um "mais" face ao
mundo. Nossa natureza, no entanto, no seu mistério só é definível quando se
inscreve nesse outro mistério, que é a transcendência mesma de Deus. Cônscio de sua posição face
ao universo e dominado pela certeza de sua participação na suprema Transcendência,
o homem não mais se colocará como Protágoras, como centro do mundo e medida
das coisas. Ele está apto para construir, com essas realidades e evidências
que lhe dominam o espírito, um humanismo de realização de sua natureza
integral. A conformidade de sua existência com sua essência, como seus fins
transcendentes, torna-se a norma próxima para a valoração das formas possíveis
de sua vida e de sua ação. Essa será a pedra de toque da liceidade dos
comportamentos possíveis, esse será o metro das criações valiosas, tanto no
mundo da personalidade como no da sociabilidade. Não será, pois, humano o
convívio que se constituir em desarmonia com a nossa natureza racional e livre.
Estão condenadas à frustração as formas sociais que não propiciarem a
realização do homem nas suas dimensões totais - de ser ético e social, político
e econômico, metafísico e religioso. Não são, conseqüentemente,
cidades humanas as cidades-colméias ou formigueiros, em que o homem é
simples agente de produção, visionadas pela obsessão do economismo ateu de
Marx, enfim as cidades-mercados, obras do capitalismo agnóstico, carentes de
fraternidade e de justiça, feiras do egoísmo e do lucro. Os panoramas dantescos dos
campos de concentração, das favelas e dos paredões, são infernos sociais. Este humanismo oferta aos
estadistas, aos sociólogos e aos técnicos do convívio, todos os valores
normativos do processo político. Nele se evidencia o valor social da verdade. Não
há ordem, não há liberdade, não há progresso onde não houver verdade e
homens que a vivam com coerência. Na ideologia que embasa este
humanismo político, estão os fundamentos da dignidade da pessoa e da transcendência
política da democracia. A dignidade da pessoa não é apenas um estatuto ontológico.
Valemos, não só pela posse de determinada perfeição de ser, mas pela livre e
responsável construção de uma existência conforme a natureza desse ser. A democracia também não é,
somente, um sistema de convívio criador da igualdade de oportunidades, da
igualdade dos direitos de todos perante a lei e assegurador da livre iniciativa.
Democracia não é, apenas, o regime em que os homens se contam para não se
baterem, tradução de uma aritmética política inspirada no tabu das virtudes
pacificadoras de uma cifra, de um número simbólico da vontade da maioria. Antes de ser uma forma de
governo ou um regime político, a democracia é um centro axiológico de
gravidade da dinâmica do convívio, das forças que integram a dimensão social
da pessoa. Ela é o estilo de projeção finalizada dos dinamismos da sociedade,
em direção aos fins integrais do homem. Em torno desse centro, não há, pois,
nem esquerdas nem direitas - existem tão só dinamismos sociais desfinalizados
que levam a sociedade a descambar nos comportamentos infra-humanos das chamadas
esquerdas ou no angelismo das denominadas. direitas. A democracia é, assim, o
desenho da autêntica cidade humana, projetada no plano do bem comum, definido
como o conjunto das situações sociais e pessoais de vida que asseguram a
realização dos fins humanos. A índole teleológica e
valiosa de sua dinâmica social, fazendo do homem; o fundamento, o sujeito e o
fim do mundo político, dele faz, igualmente, o critério supremo na estruturação
do mundo econômico. A democracia realiza, assim, a superação da antinomia da
liberdade política face à liberdade econômica e transcende a antítese do
coletivismo e do liberalismo incompatíveis ambos com a dignidade da pessoa
humana. Sob a inspiração desse tipo
de convívio político, devem processar-se as reformas nacionais. Reformemos o
que há de desumano nos fundamentos da economia do país, sem destruir e sem
deformar os valores humanos das suas estruturas históricas e culturais, que são
democráticas e que são cristãs. As forças de regulação das
reformas de que carece o país estão assim pré-traçadas na sua consciência
histórica, nos compromissos que a constituem, no gênio civilizador que nos fez
uma comunidade de homens livres. Retomemos consciência dessa
mensagem humanizante que vem do fundo de nossa História e, ao preço de asceses
coletivas, reformemos as estruturas que são desumanas, por serem incoerentes
com o espírito da civilização nacional. O humanismo que professamos
nesta exposição, deve ser a bússola da evolução político-econômica do país.
O centro magnético para onde ele aponta é o reino dos valores, que nos chamam
para as escaladas da perfeição, para novas realizações históricas da
liberdade, da justiça e da fraternidade humana. E as reformas nacionais só se
justificam como um processo de libertação, de projeção da justiça e da
liberdade sobre o mundo da produção e do trabalho, sobre a vida das fábricas
e dos campos. Disse Lenine, num momento de
feliz inconseqüência, que a implantação do comunismo na História fora obra
da uma providência negra. Após cinco décadas de produção de ruínas
sociais, o marxismo evidencia o instinto de morte dessa providência negra que
Lenine apontou em sua gênese histórica. E ele encontra, hoje, a réplica do
"animal resistente" a que aludiu Dostoiewski: a reação dessa reacionária
incorrigível, que é a natureza humana, a resistência das arestas e das leis
de suas estruturas ontológicas, imutáveis e incoercíveis. Essa resistência
surge sempre que se quer desviar a projeção de nossa vida, dos fins que lhe
traçou essa outra Providência, a autêntica, a que fez os mundos e dirige a
História, e que chama cada povo a uma vocação particular. A nossa vocação,
Joaquim Nabuco definiu-a ao dizer que a cruz dera à nacionalidade "a sua
forma eterna". No duelo mortal em que o
desumanismo marxista e a política caudilhesca, dramaticamente, disputam, com o
gênio de nossa civilização latina e cristã, o primado na direção das
reformas nacionais, optamos pela nossa natureza de homens livres, pois não
queremos ser escravos, optamos pelos destinos providenciais de nossa Pátria -
pois não queremos ser apóstatas.
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